e com a palavra...

Salvador comemora 462 anos sem render homenagens a seu primeiro cidadão



Há algumas semanas, durante o lançamento de um livro sobre a mobilidade urbana em Salvador, o jornalista e escritor Sebastião Nery observou que Diogo Álvares Correia, o Caramuru, foi o primeiro brasileiro (sem esquecer os nativos, claro) urbano. O escritor ressaltou ainda, em tom irônico, que o português, provavelmente, inaugurou o circuito carnavalesco Barra - Ondina, só que em sentido inverso, ao se deslocar do bairro do Rio Vermelho até o Porto da Barra.

Quando Caramuru aportou em solo baiano, seja por acaso ou de caso pensado, talvez não tivesse a mínima ideia do quão importante seria sua influência para o futuro da nova terra. Vale lembrar que foi a ele que El Rey mandou procurar quando a expedição colonizadora de Tomé de Souza aportasse na Bahia com a finalidade de escolher um ponto seguro para erguer a capital-fortaleza: a cidade do Salvador na Bahia de todos os Santos.

Pouco antes da chegada de Tomé de Souza, o governante anterior, Pereira Coutinho, talvez por falta de tato e sociabilidade com os nativos acabou servindo-lhes de antepasto. Em suma: foi comido, com areia. A metrópole portuguesa não desejava o mesmo destino para os futuros mandatários e sabia que, para tanto, a diplomacia de Caramuru seria imprescindível.

A cidade foi erguida, com suas diferenças sociais e geográficas aliando-se de maneira assustadora. Nada mais expressivo que a divisão de Cidade Baixa e Cidade Alta para interpretar como funciona a sociedade baiana. É o básico: o de cima tende sempre a massacrar o de baixo com a mesma força com a qual as águas castigam o quebra-mar da marina da Avenida Contorno.

A cidade cresceu, diz-se civilizada, mas ainda não aprendeu a honrar seus heróis. Quem mais indicado para tornar-se o homem-símbolo desta terra em seu dia de homenagem senão seu primeiro cidadão? Caramuru ainda é uma figura folclórica da história do Brasil. Sua contribuição no auxílio à aproximação do português com os índios é pouco mencionada e nunca ganhou a dimensão histórica que merece.

Fica a dica deste baiano e também filho do Rio Vermelho, como nosso herói - pois chegou em solo baiano um português denominado Diogo Álvares, mas o homem que saiu do mar em farrapos e a partir desse fato mudou sua história, a história de uma cidade e ajudou a fundar esta nação foi o soteropolitano Caramuru: Hora de todo baiano, de nascimento ou de paixão, apontar seu bacamarte para o céu e saudar o primeiro baiano.

(Artigo inicialmente publicado no Diga, Salvador)

BRT: será que vai colar?


Com palestra de Sebastião Nery e lançamento de livro sobre a história da mobilidade urbana da cidade, um novo sistema de transporte é apresentado: o BRT

O jornalista e escritor Sebastião Nery, 79, foi o orador convidado pelo Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros de Salvador (Setps), para o coquetel de lançamento do livro “De cá pra lá em Salvador”, escrito para comemorar os 30 anos da entidade, pela jornalista Jaciara Santos.
O evento aconteceu na noite desta quinta-feira, 17, na Associação Comercial da Bahia, no Comércio. Além do lançamento da obra, o encontro serviu para a apresentação do BRT (Bus Rapid Transit), provável novo sistema de transporte urbano de Salvador.


BRT

Trata-se de um ônibus articulado (lembra os velhos sanfonados da empresa Ogunjá, que faziam parte do transporte urbano de Salvador na década de 1990) com capacidade maior que a dos veículos convencionais. É totalmente informatizado, possui poltronas confortáveis e atenção especial ao meio ambiente: estima-se que o BRT polui menos que os ônibus convencionais, além de poder rodar utilizando Biodiesel.
O sistema é utilizado em diversas cidades, incluindo as populosas Pequim (China) e Bogotá (Colômbia). No Brasil, a cidade de Curitiba já utiliza o BRT desde 1979.


Espanto, curiosidade e um motor fadado ao “naufrágio”

As pessoas que passavam pela rua estranharam “o bicho”, mas não deixaram de dar seus pitacos. O motorista Joselito Ferreira, 55, considera que “é sempre importante ter novas alternativas para o transporte público da cidade”, mas faz um alerta: “é preciso criar toda uma infraestrutura para esse ônibus, e se não cuidar dos alagamentos na cidade, na época das chuvas, ele vai ‘morrer’ no meio da viagem, principalmente porque o motor fica na parte de baixo”, diz. O motor do BRT fica a meio metro do chão.

O taxista Otavio Rodrigues, 35, diz utilizar muito pouco os serviços públicos de transporte da cidade, mas acredita que a vida no trânsito será facilitada com a chegada de novas alternativas. “A solução é investir pesado desse jeito. Não adianta prometer, como no caso do metrô e não mostrar nada. Agora estou vendo uma realidade em minha frente”, diz.
Para o ambulante Éder Souza, 27, o pleno funcionamento desse serviço, - que só começará a rodar em Salvador a partir de 2013, durante a Copa das Confederações, evento que antecede a Copa do Mundo, que ocorrerá no ano seguinte -, depende da melhoria das vias da cidade e do zelo por parte das autoridades e da própria população. “Não adiantar oferecer esse tipo de benefício se o povo e o governo não ajudarem a manter. Sem cuidado, meu amigo, não vinga.”, completa.

Segundo o motorista Damião Marques, 45, o BRT é a melhor ideia para o transporte público da cidade. “É um veiculo que parece seguro, pelo que ouvi é todo informatizado, e além de tudo é bonito. Adoraria guiar um desses um dia. Resta esperar e torcer para que funcione,” conclui.

(Artigo inicialmente publicado no Diga, Salvador)

Velhas Virgens e Fridha movimentaram a última noite do Palco do Rock em Piatã



Para quem não tinha a menor intenção de cair na gandaia na avenida, nem tampouco hibernar entre quatro paredes, o Palco do Rock, evento alternativo que resiste há 17 anos no coqueiral da praia de Piatã foi a solução adequada. Foram quatro dias de festa, loucura e muita atitude rock and roll.

A banda paulista Velhas Virgens, comandada pelo “galanteador” Paulão de Carvalho foi a convidada para encerrar a última noite do evento. Abusando de frases fortes como “queremos boceta!“, “ninguém beija como as lésbicas!” e “abre essas pernas” esta decana do rock boca-suja levantou poeira na orla de Salvador.

Auxiliado pela performance sensual da cantora Juliana Kosso, que se autodenominava “a maior puta dos puteiros de São Paulo a Jundiaí”, e que vibrava quando o público repetia o “carinho”, Paulão tomava conta da platéia como uma dominatrix controla seu escravo. A luxúria imperava em Piatã em situações que corariam a face do próprio Baco.


Fridha

Grande surpresa dessa noite, a banda baiana Fridha, do alto de seus quatro anos de existência esbanjava talento e disposição no palco. A banda, que une o peso do rock and roll a letras politizadas parecia estar diante de um público cativo e não deixou seus “foliões” na mão. Devido ao atraso da atração seguinte, Christiano, Uilton e companhia incendiaram jovens e velhos que pulavam sem cessar no coqueiral lotado.

Se a questão é peso, não é possível encerrar qualquer relato sobre a terça-feira de carnarock em Piatã sem mencionar os competentes músicos da Trampa. A banda do Distrito Federal parecia estar jogando em casa e fez baianos e turistas voltarem ao estado mais puro da existência: o primitivo. Com a batida seca e as letras engajadas tanto os brasilienses quanto os baianos da Fridha mostraram que rock é muito mais que camisetas coloridas e dedos em riste. Rock é também e, sobretudo ATITUDE!

(Artigo inicialmente publicado no Diga, Salvador)

Claudinha negligencia povão e toma vaia histórica na Barra

Essa notícia parece meio deslocada (e é, pois aconteceu durante o carnaval... quase no ano passado), mas lá vai...


Exatamente às 22h30 da noite desta sexta-feira, 4, enquanto o asfalto do circuito Dodô (Barra-Ondina) fervilhava por baixo dos tênis ensopados de cerveja, chuva e suor dos foliões de toda parte do planeta, a banda e o encanto da loira mais sapeca da Bahia tomavam conta, podia-se dizer até que dominavam a massa entorpecida naquela região de Salvador. Mas este relato não está ainda de acordo com verdade. Não totalmente.

Claudinha abusou do poder olímpico que lhe é conferido cada vez que desafia o céu naquele caminhão anabolizado chamado Trio Elétrico. Na segunda metade do trajeto, que compreende desde o Farol da Barra até as praias calmas e de águas quentes de Ondina, mais especificamente no trecho conhecido como “Morro do Gato”, ainda na Barra, a loira apostou alto em seu carisma e caiu do cavalo.

Enquanto dedicava todo seu encanto -indiscutível-, para o badalado e milionário camarote da cerveja Skol, a cantora foi “diva” demais e perdeu o controle de seu rebanho. A começar pelo ato falho de trocar o nome da panicat Nicole Bahls pelo de Dani Bolina. Mas até aí tudo bem. Para a maioria da população tanto faz saber ou não o nome daquelas moças de corpos esculturais, contanto que elas se mantenham saltitantes e com pouca roupa.

Mas, de algum modo, este lapso que poderia ser cometido por qualquer um, ainda mais por alguém que havia puxado um bloco por mais de 3 horas, mexeu com a moça. Talvez tentando se desculpar pelo engano, Cláudia cometeu a gafe definitiva: quebrando o protocolo “obrigatório” informal dos artistas que passam pelo “Morro do Gato”, ela desprezou a massa cansada, suada e descamisada do lado pobre da rua em favor das pessoas do citado camarote. Foi a conta.


Vaias no atacado

Ao término da última música na passarela do nicho da cervejaria Cláudia retornou ao trio e tentou puxar mais um sucesso quando, de um pequeno camarote situado bem em frente, o Via Folia, a moça escutou os primeiros apupos. E a coisa tomou conta da multidão. Parecia que a menina tinha cometido a grande heresia de sua vida. Mas Claudinha desprezou também o poder contagiante de uma vaia e tratou a coisa como fato isolado. Errou de novo, e feio.

A “pipoca”, já revoltada com a falta de carinho por parte da moça que não voltou os olhos para o lado feio e pobre da Barra por um instante sequer, repercutiu a vaia. A desgraça estava feita. Cláudia, talvez ainda sem acreditar apelou para o truque mais antigo dos puxadores de trio de Soterópolis:

- Cadê a torcida do meu Bahia? Disse ela.
- Aêee! Respondeu a massa de cá.

E então se ouviram os primeiros versos do hino tricolor. A fera popular parecia domada. Qual nada. Bastou a primeira estrofe acabar e a galera já agia como torcida organizada a escarnecer um adversário figadal.

- uhhh! E mais:
- Ivete! Ivete! Ivete!

Foi a gota!


Batalha perdida

A menina tinha perdido o rebolado. Agora era fogo contra fogo e ela possuía um arsenal de respeito. A cada tom elevado pelas vaias sua banda aumentava a intensidade da música que, àquela altura não se sabia mais qual era. Em um dado momento, até o hino do Vitória foi usado para tentar acalmar os ânimos e nada. O povo queria sangue. E teve.

A menina estava acuada. Ora vaiavam, ora chamavam por sua colega de profissão, ora utilizavam os dois artifícios em conjunto. O trio seguiu em alta velocidade e sumiu na primeira curva. De longe ainda se ouviam os repiques dos percussionistas que a esta hora já deviam estar com as palmas das mãos em carne viva de tanto estapear as peles dos tambores.

Vale lembrar que, cerca de uma hora antes, Ivete Sangalo, que agora era aclamada em missa de corpo ausente, havia parado por cerca de vinte minutos no local, claro que aí entra o mercado publicitário e a guerra das marcas de bebidas, mas o fato é que a moça dispensou carinhos para o povo e esse retribuiu apaixonado. Coisa que grandes, médios e descartáveis artistas fazem há anos e que repetiram essa noite, nem sempre por amor, mas por sabedoria e esperteza. Eles sabem de onde vem sua fama e para quem devem ser dedicadas as canções.

(Artigo inicialmente publicado no Diga, Salvador)

Pseudo-Poema sujo de luz



Sumi!
Confesso.
Mas, quando decidi voltar,
Não te vi,
Nem a tua íris, bela borboleta.
Para onde os ventos te levaram?

Aquela mulher me cativou
Sem fazer nada
Não tendo culpa de nada
Pode sumir quando quiser

Sei que ela sabia que eu
Voltaria ao velho lar.
E mesmo assim
Me convidou, novamente,
Para dançar na luz,
Na rede,
A minha Rosa,
A minha sede

#ERA (O retorno ao poema no #diadapoesia)

A moça do élitro multicor



Hoje te vi entre dunas
E voando
Sobre as águas, no Rio Vermelho
Vejo-te, aliás
Em toda sombra de pedra
Nos campos
E, eventualmente
Nas flores
Onde buscas matéria-prima
Pro teu mel

De volta à prancheta...
Aliás, não era sua vida
Ali embaixo
Entre números e medidas
Escapando?

#ERA (O retorno ao poema no #diadapoesia)